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Economia
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Por Redação
30 de setembro de 2025

Cenário econômico pós “tarifaço” do governo Trump: entenda impacto no varejo alimentar

Especialistas afirmam que supermercados precisam redobrar a cautela na gestão de estoques e a atenção aos movimentos do mercado externo nesse momento

Desde agosto de 2025, a economia brasileira lida com os efeitos do “tarifaço” anunciado pelo governo Trump: uma sobretaxa de 50% sobre centenas de produtos exportados para os Estados Unidos. A medida afeta diretamente o agronegócio e a indústria, e começa a provocar impactos visíveis nas prateleiras dos supermercados.

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Produtos como carnes, frutas, café, madeira, têxteis, calçados e bebidas estão entre os mais atingidos. Com a queda nas exportações, parte da produção é redirecionada ao mercado interno, o que pressiona a oferta e aumenta a volatilidade de preços. “Para itens que não podem ser estocados, como frutas e carnes, o excesso de oferta deve provocar queda nos preços no curto prazo”, explica Eduardo Menicucci, professor associado da Fundação Dom Cabral (FDC). “Isso pode até gerar ganho momentâneo de margem para os supermercados, mas é ruim para os exportadores e traz instabilidade para toda a cadeia”, declara.

Segundo Felipe Queiroz, economista-chefe da APAS (Associação Paulista de Supermercados), os setores que foram mais afetados foram aqueles em que o Brasil não detêm o monopólio de mercado ou a hegemonia, ou que não têm competição direta com os produtores americanos. "Algumas indústrias alimentícias foram duramente afetadas. Mas devemos lembrar que mais de 700 itens ficaram de fora da lista do tarifaço, porém, outros como a carne bovina, café e açúcar foram afetados diretamente pelo tarifaço", informa.

Ainda conforme Queiroz, o aumento de impostos tende a produzir um impacto principalmente para o consumidor americano e não necessariamente para os brasileiros. "Até porque até o momento, o Brasil não adotou uma reciprocidade tributária em relação aos produtos norte-americanos. Por outro lado, o impacto da medidas do governo Trump tende a gerar um reflexo deflacionário no país, tendo em vista que no curtíssimo prazo há uma dificuldade maior de realocação dessa oferta. Por exemplo, no caso específico da carne bovina, observamos queda no preço. Então, para o americano, o impacto é de alta e para o consumidor brasileiro, o impacto tende a ser de baixa", esclarece.

Consumidor confuso, operação pressionada

Além das oscilações nas gôndolas, há impactos operacionais relevantes. A alta do dólar — mais de 12% desde maio — encarece insumos logísticos, embalagens, combustíveis e até softwares usados na gestão das lojas.

De acordo com Ahmed El Khatib, professor coordenador do Centro de Estudos em Finanças da Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (Fecap), o setor supermercadista é afetado de forma ampla: “Produtos importados de alto giro, como vinhos, queijos e azeites, já encareceram. Mas há também reajustes indiretos, como nos grãos e nas carnes, por conta do aumento nos custos de fertilizantes e ração”, comenta.

Segundo dados do setor, bebidas importadas, eletrônicos, medicamentos e alimentos processados que dependem de insumos externos subiram entre 8% e 15% apenas em agosto. Já eletrodomésticos tiveram reajustes de até 20%, refletindo tanto as tarifas quanto o câmbio. “Essa volatilidade atrapalha o consumidor, que não entende por que o mesmo produto varia tanto de preço. Muitas vezes, a culpa recai sobre o supermercado”, observa Eduardo.

Estoques sob controle, margens sob risco

Na opinião do economista da APAS, diante desse ambiente é fundamental que tanto o supermercadista quanto os comerciantes, de modo geral, adotem uma postura muito mais estratégica, companhando o mercado cambial, com um olhar atento à conjuntura internacional.

Diante da incerteza, os especialistas recomendam cautela na gestão de estoques e mais atenção aos movimentos do mercado externo. “Manter estoques baixos nos produtos mais afetados é a melhor estratégia neste momento. Não dá para assumir que o excesso de oferta vai durar”, orienta o docente da FDC.

Ahmed, da Fecap, complementa que redes menores são as mais vulneráveis: “Com menos poder de negociação, elas sofrem mais com repasses de preços e com a dificuldade de ajustar rapidamente seus portfólios”, diz.

Insumos usados na operação — como refrigeração, transporte e sistemas de controle — também estão mais caros, o que pressiona ainda mais as margens. "Quando nós olhamos para o setor supermercadista, os produtos importados diretamente tendem a sofrer muito mais do que aqueles que são produzidos no mercado local. Porém, para as indústrias que exportam para os Estados Unidos, essas, sim, sofrem muito mais e estão sofrendo com os efeitos da sobretaxa aos produtos brasileiros. Como o setor supermercadista opera muito mais ou na importação ou na venda de produtores locais, consequentemente, o impacto é menor do que ocorre, por exemplo, na indústria de transformação ou a indústria de alimentos que exporta, que tem o seu mercado principal nos Estados Unidos", diz Felipe.

Respostas estratégicas e espaço para inovação

A saída para os supermercadistas está na diversificação e na eficiência. Fortalecer parcerias com produtores locais, investir em marcas próprias e revisar o mix de produtos são caminhos indicados. “O varejo precisa buscar equilíbrio entre itens básicos e premium, privilegiando os menos voláteis”, diz Ahmed El Khatib.

A tecnologia também tem papel-chave. Ferramentas de monitoramento em tempo real e estoques preditivos ajudam a evitar excessos ou rupturas. Contratos flexíveis com fornecedores e programas de fidelização ao consumidor ganham ainda mais relevância.

Na comunicação, a transparência é essencial. Conforme o expert da Fecap, explicar os reajustes, valorizar o apoio ao produtor brasileiro e reforçar o diferencial de marcas próprias pode ajudar a manter a confiança do consumidor.

Apesar da instabilidade, o momento também abre espaço para inovação comercial. “Sempre há oportunidade para inovar, mas mudanças radicais no portfólio devem ser evitadas, porque o cenário ainda é conjuntural”, avisa Eduardo.

A capacidade de equilibrar agilidade, gestão de risco e conexão com o consumidor será determinante. “Quem conseguir unir eficiência operacional, proximidade com fornecedores regionais e inovação no relacionamento com o cliente sairá mais forte dessa crise”, conclui Ahmed.

Em relação ao processo inflacionário, o mercado norte-americano já está sofrendo acentuadamente. “Já no Brasil, o movimento é inverso. O que gerar um efeito negativo tem a ver com a movimentação do dólar, que impacta na taxa de câmbio e, além disso, afeta os juros e os fluxos de capitais no Brasil e no mundo. É nesse sentido que o tarifaço produz um impacto real e direto em diferentes cadeias produtivas", salienta Queiroz.

Comentários(1)
Jose Oscar Rodrigues
01 de outubro de 2025 às 11:49

Eu não concordo que os preços da carne bovina tenha abaixado, em todas as lojas de supermercado que tenho visitado o preço da carne bovina continua em alta.

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