
Por Redação
18 de julho de 2025Impactos da tarifa americana de 50% na economia brasileira: riscos imediatos, reações estratégicas e oportunidades para o varejo
Impacto direto nas exportações, alta de preços para o consumidor, risco de desemprego em massa e necessidade urgente de novas estratégias no varejo para garantir abastecimento, competitividade e manter a confiança do mercado
A recente decisão do governo dos Estados Unidos de impor uma tarifa de 50% sobre produtos brasileiros, válida a partir de agosto de 2025, representa um choque sem precedentes para a economia nacional. O anúncio, feito pelo presidente Donald Trump como retaliação a questões políticas e comerciais, ameaça diretamente importantes setores exportadores, como café, soja, aço e carnes, que juntos movimentam até US$ 40 bilhões anuais. Enquanto os Estados Unidos afirmam buscar correções em seu déficit comercial, especialistas apontam que a medida poderá reduzir em até 30% as exportações brasileiras ao mercado norte-americano, afetando drasticamente a balança comercial, a arrecadação governamental e o emprego em regiões dependentes do agronegócio.
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Para o varejo brasileiro, os reflexos vão além da exportação: a retaliação adotada pelo governo Lula, com tarifas recíprocas de 50% sobre bens americanos, promete encarecer produtos essenciais para o setor. Eletrônicos, insumos farmacêuticos, cosméticos e até alimentos processados devem registrar aumentos expressivos de preços ao consumidor final. Ao mesmo tempo, o real já apresenta depreciação, elevando custos de importação de maneira geral. Pequenos e médios varejistas, com menor capacidade de diversificação de fornecedores, podem ser os mais afetados, enquanto grandes redes buscam alternativas em mercados asiáticos, europeus e parceiros do BRICS para contornar a crise e manter seus portfólios competitivos.
Nesse contexto, Fabricio Tonegutti, diretor executivo da Mix Fiscal Inteligência Tributária, analisa em entrevista exclusiva ao portal SuperVarejo os desdobramentos da tarifa americana para o varejo brasileiro. Ele detalha os riscos imediatos para a competitividade, as estratégias para mitigar os impactos e as oportunidades de fortalecimento das cadeias produtivas locais. Tonegutti também aponta caminhos alternativos que podem emergir a médio e longo prazo, indicando que, apesar das dificuldades iniciais, o Brasil pode transformar a crise em um movimento estratégico para reduzir a dependência histórica do mercado americano e fortalecer a indústria nacional. Confira a entrevista na íntegra:
Entrevista com Fabricio Tonegutti, diretor executivo da Mix Fiscal Inteligência Tributária
[SuperVarejo] De que forma a nova tarifa americana de 50% impacta diretamente as importações de produtos destinados ao varejo brasileiro, e quais setores sentirão os efeitos de maneira mais imediata?
[Fabricio Tonegutti] A tarifa de 50% imposta pelos EUA sobre as importações brasileiras (ou seja, exportações do Brasil para lá), anunciada em 9 de julho de 2025 e efetiva a partir de 1º de agosto, não afeta diretamente as importações brasileiras de produtos dos EUA. No entanto, o impacto indireto surge da retaliação brasileira: o governo Lula anunciou tarifas recíprocas de 50% sobre bens americanos, o que encarece as importações dos EUA para o Brasil. Essas medidas acabam tendo dois efeitos colaterais. De um lado, isso pode reduzir o volume de importações em até 20-30% para setores dependentes, elevando custos logísticos e de abastecimento para o varejo brasileiro, que importa cerca de US$ 49,7 bilhões em bens dos EUA anualmente (dados de 2024).
De outro lado, isso vai afetar o fluxo de dólares no Brasil, fazendo com que a cotação do Dólar frente ao real fique mais cara. Basta ver o efeito já sentido desde que as tarifas foram anunciadas pelo governo americano: o dólar já subiu 2% e as tarifas ainda nem entraram em vigor! Além disso, a depreciação do real torna todas as importações mais caras, afetando o varejo de forma generalizada. Os setores mais afetados imediatamente incluem: eletrônicos e máquinas representam uma fatia significativa das importações dos EUA (cerca de 20-25%), como smartphones, computadores e equipamentos industriais usados no varejo. Insumos para cosméticos, medicamentos e produtos de higiene, com potencial aumento de custos em 10-15% devido à dependência de fornecedores americanos. Alimentos processados e bebidas, itens como sucos e carnes importadas, embora menos volumosos, podem sofrer com cadeias de suprimentos interrompidas.
SuperVarejo: Considerando o atual cenário econômico, quais são os principais riscos para a competitividade do varejo brasileiro diante dessa medida?
Fabricio Tonegutti: No contexto de crescimento econômico projetado em 2,5% para 2025 e inflação acumulada em 5,35% (acima da meta), os riscos incluem: aumento de custos operacionais com tarifas recíprocas que podem elevar preços de importação em 50%, reduzindo margens de lucro para varejistas em até 5-10%, especialmente em eletrônicos e químicos. Disrupções na cadeia de suprimentos já que a dependência de 10-15% das importações dos EUA pode causar escassez, atrasos e volatilidade, impactando estoques e vendas no varejo. Preços mais altos podem diminuir o poder de compra, com projeções de perda de 0,4-1% no PIB brasileiro devido às tensões comerciais, afetando o varejo online e físico. Varejistas menores podem perder para grandes redes que diversificam fornecedores, ampliando desigualdades no setor. Esses riscos são agravados pela incerteza global, com tarifas podendo escalar para disputas na OMC.
SV: Essa tarifa pode gerar uma pressão inflacionária sobre determinados produtos? Se sim, em quais categorias devemos esperar maiores aumentos de preços para o consumidor final?
FT: Sim, a tarifa pode gerar pressão inflacionária indireta, via tarifas recíprocas e depreciação cambial, adicionando 0,5-1 ponto percentual à inflação anual (atual 5,35%). Isso ocorre porque custos mais altos de importação são repassados ao consumidor final. Categorias com maiores aumentos esperados: eletrônicos: aumentos de 10-20% em smartphones, TVs e computadores, já que os EUA fornecem cerca de 20% desses itens; farmacêuticos e cosméticos: preços de medicamentos e produtos de beleza podem subir 5-15%, impactando o varejo farmacêutico; alimentos importados: café, sucos e carnes processadas dos EUA (ou afetados por cadeias globais) podem ver altas de 5-10%, elevando custos de alimentação cotidiana das famílias; e máquinas e insumos industriais: afetam o varejo indiretamente, via custos de produção local, com repasses de 2-5%. Analistas preveem que a inflação geral suba temporariamente, mas o governo minimiza impactos macro, estimando crescimento estável em 2,5%.
SV: Quais estratégias as empresas varejistas brasileiras podem adotar para mitigar os impactos negativos e manter a atratividade de seus portfólios?
FT: Para lidar com custos elevados e disrupções, os varejistas podem adotara diversificação de fornecedores, buscando alternativas na China (30% das importações atuais), União Europeia ou Ásia, reduzindo a dependência dos EUA em 10-20% via negociações rápidas. Promoção de produtos locais para incentivar marcas nacionais com descontos ou campanhas, potencializando produção interna e cortando custos em até 15%. Outra forma é a otimização de estoques e logística usando tecnologia para prever demandas e nearshoring (fornecedores próximos), minimizando atrasos e custos logísticos em 5-10%. A absorção temporária de custos e e-commerce ajudam a manter preços atrativos absorvendo parte das altas inicialmente, enquanto expandem vendas online para produtos alternativos, mantendo margens de volume. Parcerias e alianças com fornecedores via BRICS para descontos coletivos e lobby por subsídios governamentais também podem ser explorados pelos varejistas. Essas estratégias podem preservar competitividade, especialmente para redes grandes.
SV: Você acredita que essa medida pode acelerar o fortalecimento de cadeias produtivas nacionais e incentivar a produção local? Quais seriam os desafios e oportunidades nesse sentido?
FT: Sim, acredito que essa medida acelere o fortalecimento de cadeias produtivas nacionais, pois tarifas recíprocas incentivam a substituição de importações, similar ao que ocorreu em tensões passadas com os EUA. Projeções indicam que isso pode impulsionar a manufatura local em 5-10% nos próximos anos, reduzindo a dependência externa. As oportunidades passam pelos seguintes aspectos: Criação de empregos em setores como eletrônicos e químicos podem gerar 100-200 mil vagas com investimentos em produção local; independência econômica para o fortalecimento via BRICS, com foco em energia e tech, elevando exportações para esses mercados em US$ 234,8 bilhões anuais; e inovação com Incentivos governamentais (como o PAC) para R&D, transformando a tarifa em "virada estratégica". Entre os desafios estão investimentos iniciais que precisam de US$ 2-3 bilhões em infraestrutura e tecnologia, com riscos de inflação de insumos importados; transferência de tecnologia e dependência de know-how estrangeiro, que pode atrasar a produção em 6-12 meses; além de margens estreitas para as Indústrias, como citrus e aço, que enfrentam margens baixas para absorver custos. No geral, os benefícios superam os riscos a longo prazo, promovendo resiliência.
SV: A médio e longo prazo, quais caminhos alternativos de abastecimento e negociação internacional podem ser explorados pelo varejo brasileiro para reduzir a dependência do mercado americano?
FT: A médio prazo (6-12 meses), China e a Ásia podem explora o varejo aumentando importações de eletrônicos e têxteis (já 30% do total), com custos 10-20% menores via acordos bilaterais. União Europeia e Índia a partir de fornecedores de químicos e pharma, com negociações para reduzir tarifas via pactos comerciais. A longo prazo (1-3 anos), BRICS e América Latina podem fortalecer laços com Índia, Rússia e África do Sul para suprimentos diversificados, evitando US$ 42,3 bilhões em dependência americana. Nearshoring regional inclui parcerias com México ou Argentina para logística mais barata, reduzindo riscos globais. Em relação à tecnologia e sustentabilidade, é possível adotar blockchain e IA para otimizar cadeias, focando em fornecedores ecológicos para atrair consumidores. Esses caminhos podem cortar a dependência dos EUA em 50%, promovendo crescimento sustentável.